segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Cadeias do RN não cumprem Lei Penal


Tribuna do Norte



Carlos Henrique Goes
Repórter    
Nenhuma unidade prisional do Rio Grande do Norte cumpre - em maior ou menor escala - as normas da Lei de Execuções Penais (LEP), que trata sobre o direito do reeducando nas penitenciárias do Brasil, e a sua reintegração à sociedade. Os problemas vão desde a superlotação das unidades - no RN há dois presos para cada vaga existente no sistema -, passando pela falta de assistência médica e inexistência de comissões técnicas de qualificação (responsável por agrupar detentos mediante a pena ,antecedentes e personalidade). 
Rodrigo SenaNo Rio Grande do Norte são dois presos para cada vaga existente
No Rio Grande do Norte são dois presos para cada vaga existente

As deficiências do sistema carcerário do Estado também seguem pela falta de estrutura física e de equipamentos de segurança que consigam organizar e manter a ordem nas unidades. E essas falhas são reconhecidas pelos próprios gestores estaduais. Pelo menos R$ 5 milhões seriam  necessários hoje para aparelhar as 34 unidades prisionais do Rio Grande do Norte com o aparato mínimo de segurança. A estimativa é do titular da Coordenadoria de Administração Penitenciária (Coape), José Olímpio, e diz respeito a aquisição de bloqueadores de celular (inexistes no RN), detectores de metal (encontrados em apenas seis unidades prisionais), aparelhos de raio-x (existentes somente em quatro), câmeras de segurança (vistos em cinco prédios carcerários). 

As soluções para as deficiências chegam a conta-gotas. O secretário de Justiça e Cidadania, Thiago Cortez, revela que foram liberados pelo Ministério da Justiça R$ 400 mil para a aquisição de 100 coletes multi-ameaça, 85 armas de função letal e não-letal, além de 1.750 munições, material básico para o desempenho do ofício de agente penitenciário. Equipamentos que há 10 meses a categoria aguarda para garantir a segurança deles próprios e dos detentos. 

Thiago também fala da solicitação ao Departamento Penitenciário Nacional (Depen) e Ministério da Justiça de um incremento de R$ 2,5 milhões somente para informatizar o sistema carcerário potiguar e implantar a tecnologia de controle facial, câmeras de segurança, além de funções triviais de cadastramento e controle de carteira de visitas. Uma planilha detalhada sobre quanto será utilizado para cada um dos itens ainda está em fase de preparação e avaliação. " É prioridade nossa a questão da segurança e o investimento em tecnologia", garantiu Cortez. Um aparelho de bodyscan - aqueles que fazem um raio-x avançado - custa em média R$ 1 milhão de reais, aponta o titular da Sejuc sinalizando para quão oneroso pode ser o investimento neste setor.

No tocante a estrutura já disponível, a eficácia dos equipamentos é duvidosa. No caso do sistema de câmeras de segurança, o que acontece é a captura de imagens em tempo real e não o registro delas, pelo menos no caso dos CDPs da Ribeira e Candelária. Ou seja, em caso de fugas ou invasões, o material não poderá ser recolhido para substanciar procedimentos investigativos.

Insegurança ronda unidades prisionais

A TRIBUNA DO NORTE visitou os CDPs da Ribeira e Candelária e presenciou o avesso do que determina a Lei de Execuções Penais (LEP). Na unidade da região leste da capital, a disponibilização de 6 metros quadrados para cada preso tem sido flagrantemente desobedecida. Com 120 presos distribuídos em nove celas de aproximadamente 21 metros quadrados, nas quais em algumas delas se tem 18 presos, vemos cair por terra o "registre-se e cumpra-se" da lei. A inexistência da Comissão Técnica de Classificação também compõe o quadro de distorções.  O direito a assessoria jurídica também é dever do Estado (Art. 11 do capítulo II da LEP). Eriberto Anderson da Silva, 28, preso por tráfico e homicídio, crimes praticados em Mossoró, reclama que há quatro anos espera por uma audiência pública. "A Lei determina que em 180 dias o preso provisório seja conduzido a audiência e julgado", acrescentou Vilma Batista, vice-presidente do Sindicato de Agentes Penitenciários do RN (Sindasp-RN). 
henrique gomes- A mesma Lei 10.752 determina que estabelecimento prisional deve restringir o acesso dos presos a meios de comunicação. Constantemente celulares são encontrados nas dependências das unidades. Três celulares foram encontrados na Plantão Zona Sul (foto) durante revista após início de motim no último dia 13.
- A mesma Lei 10.752 determina que estabelecimento prisional deve restringir o acesso dos presos a meios de comunicação. Constantemente celulares são encontrados nas dependências das unidades. Três celulares foram encontrados na Plantão Zona Sul (foto) durante revista após início de motim no último dia 13.

No artigo 12 do capítulo citado, também se vê disposto a obrigatoriedade de o Estado fornecer alimentação, vestuário e instalações higiênicas. Presos e Sindasp denunciam que há 60 dias não tem havido distribuição de pães para o café da manhã. Vilma Batista destaca que o vestuário foi oriundo de recursos dos agentes que além de comprarem o fardamento próprio também o fizeram comprando calções e camisetas para os detentos. "A ideia era padronizar as vestes dos presos. Dar uma boa impressão porque eles satisfeitos acaba refletindo nas condições de trabalho da gente", justificou. No artigo 16 é retomado o direito a assessoria jurídica, onde fica expresso que "as  unidades federativas devem ter o serviço de assessoria nos estabelecimentos penais".

Sobre a saúde, não existe instalações ambulatoriais ou dentárias. "Existem presos doentes e acaba sendo o agente que nos casos menos graves, como uma dor de cabeça,  acaba dando um medicamento porque não tem um suporte aqui",  contou a sindicalista. Agentes da unidade acrescentaram que não têm recebido máscaras e luvas para  lidar com aqueles presos que possuem doenças infecto-contagiosas. "Nós, para fazermos uma revista, temos que ter contato direto com eles sem proteção. É tão comum a gente pegar doença de pele, por exemplo", complementou.

Candelária

Na unidade da zona Sul, 95 presos estão distribuídos em sete celas, sendo cinco delas de 12 metros quadrados e as outras de 15 metros quadrados. Nessa unidade, há câmeras de vigilância, mas em compensação, existe a falta de equipamentos básicos: há uma única algema para os presos, barras de ferro são usadas como arma pelos agentes no momento de irem até os pavilhões. Insegurança para eles e  moradores de Candelária que podem ser atingidos diretamente com uma fuga. O diretor da unidade, Francisco Canindé Alves, informou que o detector de metais usado, especialmente, durante as visitas, está quebrado e "vai ser consertado em breve".

Quanto ao atendimento médico, relatou haver um acordo informal dele com médicos do posto de saúde do bairro, para periodicamente receber visitas de um médico clínico geral, além de conduzi-los ao PS para tratamento dentário. A existência de um armário com medicamentos oriundos da unidade Psiquiátrica da zona Norte. 

Maior unidade do sistema não tem boa estrutura

A estrutura interna de segurança da Penitenciária Estadual de Alcaçuz conta hoje com um aparelho de raio-x - que se encontra quebrado desde o início do ano-, responsável pela verificação dos alimentos levados para os presos. O aparelho foi doado pelo Governo do Rio de Janeiro, em 2007, após a realização dos Jogos Panamericanos. O estabelecimento não possui um sistema de câmeras interno, a partir do qual se possa acompanhar as ações desenvolvidas pelos presos. Uma das poucas unidades a possuir um consultório dentário equipado, não funciona devido a falta de odontólogo.

Aquele que foi inaugurado em março de 1988, e apresentando como sendo de segurança máxima, tem seu portão frontal fechado com o auxílio de uma algema. No portão que dá acesso ao pavilhão 1, outro arco de algema é utilizado. Os agentes utilizam   detectores de metal manuais, demonstrando ao longo dessas quase duas décadas que a denominação não condiz com a verdade. Do corte da fita inaugural aos dias de hoje, muitas foram as fugas e crimes praticados lá dentro. A situação já se assemelha a do Complexo Penal João Chaves, desativado oficialmente em 5 de agosto de 2005 através do decreto nº 18.406, onde a superlotação e desgaste da estrutura foram temas de recorrente citação por parte da imprensa, administração e sociedade. Estão custodiados 613 presos na unidade de Nísia Floresta, criada para receber 420 homens.

Lei de Execuções Penais foi criada em 1984

Criada em 11 de julho de 1984, a Lei nº 7.210, ou Lei de Execuções Penais, dispõe sobre as o papel do Estado sobre o preso desde o momento em que o indivíduo é detido e, oficialmente, está sob responsabilidade do Estado. "A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado ou internado", expõe o 1º artigo dessa legislação. Nela, estão as prerrogativas voltadas a disciplinar os processos de prisão, julgamento, condenação, cumprimento de pena e ressocialização. Uma das mais recentes alterações da LEP - mediante a Lei nº 10.752, de 1º de dezembro de 2003 -, trata no artigo 3º da obrigação dos estabelecimentos penitenciários disporem "de aparelho detector de metais, aos quais deve submeter todos que queiram ter acesso ao referido estabelecimento, ainda que exerçam qualquer cargo ou função pública". 

Regimento

O RN também tem Regimento Interno Único dos Estabelecimentos Prisionais do RN, que adota os princípios contidos nas regras mínimas para o tratamento dos reclusos e recomendações pertinentes, formuladas pela Organização das Nações Unidas - ONU. Com 192 artigos, detalhando direitos e deveres dos apenados do Estado o regimento entrou em vigor, oficialmente, em 29 de março deste ano, embora nunca tenha saído do papel.

Nenhum comentário:

Pesquisar este blog

Artigos

Gestão do Blog

Minha foto
Militar Estadual - Estudante de Direito - Área da segurança pública.