(*) Rinaldo Barros
Faz um tempinho que estou querendo entender melhor – mania de sociólogo – esse surgimento de uma “nova classe média”, aqui no patropi.
Diariamente, todos os brasileiros convivem e visualizam os resultados decorrentes da pobreza, na qual a maioria da população nacional se encontra. Uma parcela da população (senso comum) acredita que a condição de miséria de milhares de pessoas espalhadas pelo território brasileiro é causada pela preguiça, falta de interesse pelo trabalho, acomodados à espera de programa sociais oferecidos pelo governo.
Em suma, acham que só não trabalha quem não quer. No entanto, isso não é verdade.
Nas últimas décadas, o desemprego (e a fome) cresceu em nível mundial paralelamente à redução de postos de trabalho, que diminuiu por causa das novas tecnologias disponíveis que desempenham o trabalho anteriormente realizado por uma pessoa, a prova disso são os bancos que instalaram caixas de auto-atendimento, cada um desses corresponde a um posto de trabalho extinto. É o desemprego estrutural.
Isso tem promovido a precarização dos vínculos de trabalho, isso quer dizer que ninguém está garantido em seu emprego, e todos buscam uma permanência no mesmo.
Atualmente, quando um trabalhador é demitido e não encontra um novo emprego em sua área de atuação, ou em outras, fica impedido de gerar renda, sem condições de arrecadar dinheiro através de sua força de trabalho. As pessoas enfrentam dificuldades profundas e às vezes convivem até mesmo com a fome.
Esse processo de distribuição de renda e desemprego obriga as pessoas a procurar lugares impróprios à ocupação urbana, como não tem condições financeiras para custear moradias dignas, habitam favelas e áreas de risco, desprovidas dos serviços públicos (esgoto, água tratada, transporte, saúde, educação).
A pobreza é decorrente de vários fatores, os principais são os processos de globalização, a modernização dos meios de produção e a brutal desigualdade de distribuição da renda.
Em que pese a constatação de que essa desigualdade ainda permanece, o aumento da renda do brasileiro, via políticas compensatórias e crescimento econômico, incorporou 27 milhões de pessoas às camadas médias, mudando a divisão dos recursos e alterando os padrões de consumo no País.
Hoje, a classe média brasileira, composta por cerca de 98 milhões de pessoas, tem 46% da renda nacional, de acordo com dados da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O fenômeno despertou o interesse dos grandes empresários. Tanto que a Confederação Nacional da Indústria (CNI) idealizou e realizou um amplo estudo da classe média, analisando comportamento social, ambições profissionais, projetos de sociedade e padrões de consumo. O projeto resultou no livro “A Classe Média Brasileira – ambições, valores e projetos de sociedade”, escrito pelos cientistas políticos Amaury de Souza e Bolívar Lamounier.
Uma coisa é certa. Para impulsionar a “nova classe média”, é crucial manter a inflação baixa, baixar os juros, aumentar ou manter o nível de empregos formais, assim como melhorar a educação (ainda) de baixa qualidade oferecida pelas escolas e universidades.
É preciso não esquecer, entretanto, que ainda falta muito para que essa “nova classe média” se estabeleça de forma mais sólida porque, apesar do aumento da renda, a instabilidade ainda é grande, uma vez que muitos empregos não são fixos. E, principalmente, porque o conceito de classe se define na esfera da produção, e não na ponta do consumo.
Por sua vez, o surpreendente aumento do consumo desta “nova classe média” é sustentado pelo risco do endividamento das famílias, ou seja, pela oferta de linhas de crédito direto ao consumidor, com juros muito altos. Os estudos sobre a inadimplência apontarão para o futuro desses novos e sôfregos consumidores. Quantos endividados honrarão suas dívidas? Os empregos serão mantidos?
Ainda é preciso observar por mais algum tempo para aferir se este é um fenômeno duradouro (estrutural), ou se é apenas uma bolha conjuntural, resultante de um crescimento artificial e temporário da economia, sustentado pelo endividamento.
Por enquanto, o que é certo é que a chamada “nova classe média” é ainda uma camada social formada por milhões de pessoas endividadas. Oxalá não voltem a ser pobres.
(*) Rinaldo Barros é professor da UERN e Diretor do ITV
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