De vez em quando bate um banzo daqueles! Lembranças da tenra idade, das peripécias da inocência vivida no interior. Dos joguinhos de bola nos campos de areia e barro batido, dos banhos de rio e açude ainda impolutos frente a ação humana; do andar na caatinga com o sol causticante, colhendo frutas em épocas como as dos cardos ou dos umbus, e, nas regiões serranas, os cajús.
A cidade grande para nós era um encanto que vivíamos apenas em sonhos. Lembro-me da primeira vez que cheguei à capital. Premio por uma traquinagem: fratura do braço depois de uma queda sofrida quando estávamos a passear em cima de um velho “Dodge”. Ainda idos de 77, vi grandes prédios, muitas luzes e faróis. Todavia a Capital ainda ostentava um aspecto de cidade em desenvolvimento, sem muitos carros, com bons espaços nas ruas, onde circulavam mais amigavelmente motoristas e pedestres. Mas mesmo com todo o deslumbramento, nada era ou é igual ao rincão ao qual nos filiamos.
O Seridó potiguar é uma belezura sem igual, mesmo hoje com todo o processo de desertificação acelerado, fruto do descaso dos governos e mais governos, da falta de medidas efetivas para com os efeitos das estiagens e também da necessidade premente da sobrevivência do povo sertanejo, que usufrui dos ricos recursos propiciados pelo bioma da caatinga, vegetação predominante do sertão potiguar sem a sabença do chamado desenvolvimento sustentável. O sertão é lindo!
Quando das épocas das cheias, de bons invernos, não tem como não se encantar com as sangrias das barragens e dos açudes. Vira uma atração a parte que traz de volta pessoas que se distanciaram da terra e também aquelas que apreciam uma linda paisagem natural. Nestes períodos as festas regionais são mais fortes, marcantes. As cidades celebram seus patrocínios religiosos e profanos mais intensamente. São assim as Festas de Santana em Currais Novos e em Caicó, bem como a Festa de Nossa Senhora da Guia, da cidade mais limpa do Brasil: Acari. Vem gente de todo o Brasil para apreciar tão aconchegantes e calorosas comemorações.
É por isso tudo e muito mais que de vez em quando bate uma saudade da terrinha querida, daquela cidade que nós viu nascer e nos acolheu e depois, por vontade do destino, nos viu partir para voltar a cada ano com mais vontade, mais amor.
Mais o interior não é somente isso: cidades pequenas são exemplos de civilidade, amizade e confiança mútua. É muito fácil encontrar o alcaide mor da cidade na feira livre, tirar um dedinho de prosa, cobrar uma política aqui, outra acolar; bem como ser recebido pelo magistrado local, pessoa mais simples do que os togados da Capital; é possível também fazer amizades e ser chamado de Mairton, de Fátima, José de Antonio, ou Maria de Tomáz. É possível ainda, mesmo com a chegada das drogas por imposição de um comércio torpe, ilegal e destrutivo, dormir com as portas e janelas abertas, pois conheço o meu vizinho e este me conhece. Faltou um pouquinho de açúcar? Menino, vai lá na comadre e pede um naco emprestado, depois devolvemos e assim segue a pacata vida interiorana.
Talvez esteja sendo um tanto idílico e a realidade seja outra, mas só em chegar no Seridó potiguar e passar por estas cidades maravilhosas, lembro da minha infância, que mesmo na dificuldade e na pobreza, sempre houve dignidade e fartura. Nunca ficamos sem uma refeição diária, fato que infelizmente se concretizaria na chegada na Capital, alguns anos depois que com muita luta e perseverança dos pais, com muito suor e trabalho, nunca mais aconteceu.
Mas o interior é assim mesmo. Não somente podemos ver essa solidariedade, essa pacificidade e gentiliza no Seridó, mas em todas as cidades de pequeno porte do interior norteriograndense. As pessoas são boas, receptivas e caridosas. Dispostas a ajudar quem quer que mais precise. Nunca vi minhas tias, minha avó e meus parentes dizerem um não a um cidadão mais carente quando este batia à porta. Nunca vi nenhuma destas pessoas negar um copo de água ou um prato de comida a quem quer que fosse.
É por isso e muito mais que sinto saudades da terrinha, da qual nasci, vivi poucos anos e depois parti. Por isso que quando posso, fujo das incivilidades da cidade grande e volto para meu amado Seridó.
Mairton Dantas Castelo Branco – maj PMRN
Imagem: Currais Novos-RN: web: Mazilton Galvão
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